O município de Quaraí (RS) tem sido o símbolo da onda de calor que vem afetando o Rio Grande do Sul. Por quatro dias seguidos, a cidade de 23,5 mil habitantes, que fica na fronteira com o Uruguai, registrou a temperatura mais alta do Brasil, segundo dados do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia).
A última vez foi nesta quarta-feira (5/1), quanto os termômetros marcaram 41,2ºC. Na terça-feira (4/1), Quaraí enfrentou a maior temperatura já registrada em 115 anos no Rio Grande do Sul: 43,8ºC.
A geografia explica em parte as altas temperaturas registrada. Localizado no extremo oeste do Rio Grande do Sul, o município está muito próximo da bolha de calor que tem seu ápice nas províncias do centro e do norte da Argentina.
“À medida que essa bolha de calor vai se intensificando, ela atinge os municípios da metade oeste do Rio Grande do Sul, que pela continentalidade, ou seja, por estarem mais no interior do continente, têm uma tendência a registrar maiores extremos de temperatura, tanto para o calor quanto para o frio”, explica Estael Sias, diretora da MetSul Meteorologia.
No entanto, a meteorologista lembra que o recorde gaúcho de temperatura nesta época do ano só ocorre porque outras regiões do Brasil estão com as temperaturas amenizadas pelas chuvas. "Se não estivesse chovendo no Centro-Oeste, por exemplo, facilmente poderíamos ver temperaturas acima de 40ºC nessa região", explica.
O município de Quaraí não deve ter um alívio do calor tão cedo. Nesta semana, o Inmet prorrogou o alerta de onda de calor no Rio Grande do Sul até segunda-feira (10/2). As regiões em alerta vermelho de “perigo extremo” são o sudoeste, sudeste, noroeste, nordeste, centro-ocidental e centro-oriental do Rio Grande do Sul, além da região metropolitana de Porto Alegre e o oeste de Santa Catarina. O fenômeno é caracterizado por, pelo menos, cinco dias consecutivos com temperaturas 5ºC acima da média climatológica da região.
Segundo a Metsul, as temperaturas altas e a falta de chuva em Quaraí devem se manter até o dia 10 de fevereiro. “Na sexta-feira e no sábado pode dar uma aliviada por mudança de ventos, mas as tarde seguirão com 34 ºC a 36ºC graus, então a população não deve perceber muito uma redução. Depois haverá um repique dessa onda de calor entre os dias 9 e 10”, comenta Estael.
Somente entre os dias 11 e 12 há possibilidade de chuva. “A partir do dia 13, com vento sul mais forte, a população terá um alívio, com a temperatura caindo para 16 ºC, 17ºC nas madrugadas e até 29ºC durante a tarde entre os dias 14 e 15”, afirma a meteorologista.
Produção agropecuária sofre
A produção agrícola também sofre os efeitos do clima no município de Quaraí. O pequeno produtor Rogério Martins estima uma perda de cerca de R$ 180 mil com a estiagem. O maior prejuízo foi em sua lavoura de melancias, que estava em início de colheita. “Tinha frutas com 20 quilos, mas o sol destruiu as plantas em uma semana. Não consegui vender 10% da produção”, lamenta.
Martins também perdeu dois hectares de milho que havia plantado para silagem de gado de corte. “Plantei pouco nesta safra já esperando uma estiagem que estava prevista para novembro por causa do fenômeno La Niña. Como ele não ocorreu naquela época, resolvi apostar. Mas a seca veio depois e o milho já nasceu cheio de falhar. Houve ataque de lagartas, e nem investi passando defensivo agrícola porque não valia mais o gasto”.
A seca também destruiu 30 hectares de pastagem plantada com os capins braquiária e sudão. Para alimentar as 100 cabeças de gado que possui, Martins está recorrendo a uma área de campo nativo que ainda não foi afetada.
Para dar água ao gado, Martins havia aberto três açudes em sua propriedade. Dois já estão completamente secos. “O que sobrou, a cada dia está diminuindo. Aqui sempre foi um lugar de abundância de água. Mas hoje, lugares que eram banhados estão completamente secos. E cada ano fica pior”, afirma.
"Muitos criadores de gado, especialmente os pequenos, estão sem água para dar de beber aos animais, que estão sofrendo com estresse térmico", destaca Milena Ferreira Machado, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Quaraí. "Os bovinos sentem muito os efeitos do calor, especialmente no ganho de peso, e não encontram tanta variedade de alimento porque os produtores não conseguem cultivar pastagens", comenta.
Segundo Milena, o município já está há mais de 20 dias sem chuvas expressivas. "Nossa maior produção é arroz, mas essa cultura não deve ter grandes perdas, porque as lavouras são irrigadas e já estão em fase de colheita. As principais dificuldades são enfrentadas pelos pequenos agricultores familiares, que fazem cultivos de feijão, melancia e milho silagem, principalmente, todas lavouras de sequeiro, e que não contam com irrigação", avalia a dirigente. (Com Globo Rural)