Se a lista de exceções à tarifa de 50% anunciada pelos Estados Unidos ao Brasil trouxe alívio a uma parte dos exportadores, é na regra que anda morando a preocupação.
Ao menos é isso que argumentam produtores, empresários e acadêmicos do Rio Grande do Norte à CNN, cujo estado dirige cerca de 47% de sua exportação de sal marinho aos EUA.
O produto, assim como a carne, pescado, café e madeira, não escapou da sobretaxa, e as novas barreiras tarifárias poderão excluir o sal nacional do mercado norte-americano.
"Com o tarifaço, nosso comércio exterior está reduzido em quase 50%. Isso é muito relevante", destaca diz Airton Torres, presidente do Siesal-RN (Sindicato da Indústria da Extração do Sal do Estado do Rio Grande do Norte).
No começo de julho, o Siesal chegou a soltar uma nota calculando os impactos das tarifas à economia potiguar. O sindicato afirma que o estado é responsável por 98% da produção de sal no Brasil, e que o enxugamento do setor pode colocar 4 mil empregos em risco — tanto diretos quanto indiretos, na venda, distribuição, e frete rodoviário e marítimo).
Segundo o Siesal, os EUA consomem cerca de 50 milhões de toneladas de sal por ano. Desses, 32% (16 milhões de toneladas) são importados. Segundo o presidente, a média de vendas do Rio Grande do Norte ao país é de 550 mil toneladas anuais — cerca de 34% desse total.
“O sal é estratégico e a derrocada da indústria salineira jogará o Brasil na dependência da importação”, diz o documento.
Limitado ao Atlântico
Enquanto a tarifa segue em vigor, há duas (86% menos do que nossos vizinhos, para referência). saídas de curto prazo disponíveis: a busca de mercados alternativos ou a circulação dos produtos dentro do próprio país.
Para ambas as soluções, há limitações originárias da própria natureza do produto. O sal é comercializado a baixo custo: dados do site GlobalProductPrices, coletados de março de 2022 a junho de 2025, mostram que o tempero custa por volta de US$ 0,54 no Brasil — cerca de R$ 2,95, na cotação atual.
Torres, do Siesal, explica à CNN que isso limita as exportações para os parâmetros do Oceano Atlântico (leia-se: costas latinas e americanas e costa oeste africana). A distâncias maiores, torna-se impossível o produto ser competitivo.
Sal na ferida
Se novos mercados são improváveis e o Tio Sam deixou de ser opção, o que resta aos potiguares é voltar suas vendas ao mercado interno. Isso pode causar uma série de outros problemas.
O mercado brasileiro é mais enxugado de demanda do que o norte-americano. O Siesal estima que, por aqui, sejam consumidos cerca de 7 milhões de toneladas ao ano (86% menos do que os EUA, para referência).
"A questão é que o mercado interno já está sendo atendido. Jogar esse sal aqui dentro seria ruim para as empresas que exportam e para as que atuam aqui", argumenta Narciso Neto Souto, diretor presidente da F. Souto, empresa familiar de extração, beneficiamento e comercialização de sal marinho localizada em Mossoró, no interior do estado.
Segundo o empresário, que trabalha exclusivamente com o mercado interno, a demanda pelo produto cresce a ritmo lento. Somado à competição internacional (o Chile também vem exportando o tempero ao país, cortesia da isenção de impostos promovida pelo Mercosul), o impacto imediato seria, naturalmente, uma redução no preço do produto.
A primeiro momento, qualquer consumidor sensato comemoraria o desenrolar da coisa. Mas Souto argumenta que, para o bolso do brasileiro, o impacto é mínimo, dada a durabilidade e preço já acessível do produto. Quem sofre mais são os produtores potiguares.
"Além disso, a maior parte dos compradores de sal não são pessoas, e sim indústrias e grandes players do mercado. Eles podem valer dessa situação para obter vantagens e descontos na aquisição da matéria-prima", alerta Joedson de Farias, professor de macroeconomia na UERN (Universidade Estadual do Rio Grande do Norte).
De bate pronto, o tarifaço do republicano já tem consequências no mercado. Souto conta à CNN que sua empresa estava para inaugurar uma nova refinaria este ano, cujas obras estão suspensas até segunda ordem.
"Estou segurando mais [o término da refinaria], porque não temos certeza se conseguiremos crescer", desabafa.
Reversão é possível? Setor diverge
Para mitigar os danos, o setor não está alinhado sobre o melhor caminho a seguir. Torres, do Siesal-RN, mostra otimismo nas negociações, afirmando que uma reversão da tarifa ainda não está fora de cogitação.
"Nós temos a esperança de que o bom senso prevaleça", diz.
"Do lado brasileiro é importante que continuemos exportando, e do lado americano também é importante a manutenção das importações. Ele é muito necessitado do sal que recebe do exterior. Nessa primeira semana, estamos alimentando expectativa favorável".
Souto, da F. Souto, não tem uma visão tão esperançosa, e acredita que seus colegas do mercado interno também não.
"Estou pessimista, especialmente a curto prazo. Tem muitas questões políticas envolvidas, nenhum dos dois lados quer ceder. Não vejo sinalização de que isso melhore nem de um lado, nem de outro", finaliza.
Enquanto o cabo de guerra comercial continua, Farias, professor da UERN, entende que a saída é que os governos estadual e federal proporcionem algum incentivo às indústrias prejudicadas.
"Apesar de não ser um produto que causa grandes implicações à balança comercial, ele é importante do ponto de vista estadual e, principalmente, dos empregos", alerta.
"Não tenho grandes expectativas. Mas esperamos que se chegue em termos melhores, para o Brasil e, especialmente, para o Rio Grande do Norte". (Com CNN)