A estudante de direito Ana Paula Veloso Fernandes, de 36 anos, tinha um padrão após cada assassinato, segundo a polícia: ela mesma ligava para avisar da morte.
Em todos os boletins de ocorrência levantados, a suspeita aparece como denunciante, testemunha ou até suposta vítima — uma estratégia, segundo os investigadores, para manipular as apurações e afastar as suspeitas sobre ela.
“Ela tinha prazer em manipular as investigações. Criava versões, inventava ameaças e usava a própria polícia para sustentar a narrativa dela”, afirmou um investigador.
Primeira vítima: o vizinho em Guarulhos
O comportamento chamou a atenção pela primeira vez em janeiro, quando Ana Paula ligou para a Polícia Militar e relatou que o vizinho Marcelo Fonseca, em Guarulhos, estava trancado em casa havia dias e não respondia.
No registro de áudio, ela fala com calma e aparenta preocupação. Mas, nas imagens gravadas no local, chega a esboçar um sorriso ao ser informada de que o homem estava morto, segundo a polícia.
Investigadores dizem que Marcelo foi envenenado dias antes, e que a suspeita continuou morando na casa dele após o crime, sob o pretexto de um aluguel.
Em outro caso, ligou duas vezes para denunciar ‘assassinato’
Meses depois, em maio, Ana Paula voltou a acionar a polícia — desta vez, para denunciar a morte de Maria Aparecida Rodrigues, uma mulher de quem havia se aproximado por meio de um aplicativo de relacionamentos.
Ela usava um nome falso, “Carla”, e afirmou no boletim de ocorrência que Maria Aparecida teria sido assassinada por um policial militar com quem ela própria havia se envolvido.
“Ela ligava, inventava ameaças, produzia bilhetes e fazia com que as vítimas assinassem documentos que reforçassem as versões criadas por ela”, explicou o delegado Halisson Ideião.
Dias depois, insatisfeita com o resultado do registro — que foi classificado como morte natural —, Ana Paula ligou novamente para a polícia, alegando ter encontrado um bolo “com cheiro de morte” em sua sala de estudos. A perícia foi chamada, mas nada foi constatado.
'Sempre como denunciante ou testemunha'
A partir daí, os investigadores cruzaram os registros e descobriram que Ana Paula estava presente em todas as mortes investigadas, sempre como comunicante.
Ela também foi quem registrou o boletim de ocorrência da morte do tunisiano Rider Mahares, de 21 anos, com quem manteve um relacionamento. Em outro caso, viajou ao Rio de Janeiro para matar um idoso, pai de uma ex-colega de faculdade, envenenado a pedido da filha.
“Ela comparecia constantemente à delegacia, queria saber o andamento dos inquéritos, se as perícias confirmavam envenenamento. Esse foi o ponto de virada da investigação”, disse Ideião.
Investigação e prisão
A Polícia Civil de São Paulo afirma que o comportamento de Ana Paula foi determinante para enquadrá-la como uma possível serial killer. Ela e a irmã, Roberta Fernandes, também investigada por participação nos crimes, estão presas preventivamente.
O caso é acompanhado pelo Núcleo de Análise Comportamental do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), que apura a motivação e o padrão de atuação da suspeita.
“Ela tem prazer em matar. A motivação pouco importa para ela”, afirmou Ideião. “Ela quer matar e quer ser vista como a pessoa que descobre o crime.”
Ana Paula e a irmã Roberta, suspeita de ser cúmplice, já estão presas. Em depoimento, Ana Paula confessou participação em dois dos assassinatos, mas negou o uso de veneno. A defesa afirma que ela apenas relatou os fatos e que a verdade será esclarecida ao final das investigações. (Com g1 e Fantástico)