Aprovado em primeira discussão na sessão desta terça-feira (27), da Alems (Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul), o Projeto de Lei 104/2024, da deputada estadual Gleice Jane (PT), que institui o chamado “Protocolo Sul-Mato-Grossense Antirracista”, tem sido classificado como uma iniciativa mais simbólica do que efetiva no combate ao racismo.
A proposta busca incentivar — de forma voluntária — que estabelecimentos de grande circulação no Estado adotem medidas de prevenção, conscientização e acolhimento às vítimas de racismo e injúria racial.
O texto também prevê a criação de um Certificado Antirracista, que seria concedido aos locais que aderirem ao protocolo.
O problema, segundo especialistas em direito consultados pela reportagem, é que a proposta não cria qualquer obrigação legal e tampouco inova no ordenamento jurídico. Isso porque o racismo já é crime no Brasil há mais de três décadas, com penas previstas na Lei Federal nº 7.716, de 1989, além de estar classificado na Constituição como crime inafiançável e imprescritível.
“É uma medida de boa intenção, mas inócua do ponto de vista prático. O racismo já é crime, inclusive com penas severas. O que falta é efetividade na aplicação da lei, não selo de boas práticas”, afirma um promotor que atua na área de direitos humanos.
Selo simbólico
Na prática, o projeto não impõe qualquer sanção para quem não aderir. É uma política de estímulo, sem força de obrigatoriedade. Para alguns parlamentares e juristas, a iniciativa, embora bem-intencionada, tem baixo impacto prático, funcionando mais como uma estratégia de marketing social.
“Não é o selo que vai impedir práticas racistas. É preciso fortalecer os mecanismos de denúncia, fiscalização, responsabilização e punição. A legislação brasileira já é rigorosa nesse tema, o que falta é aplicar”, critica um advogado ouvido pela reportagem.
A deputada Gleice Jane (PT) argumenta que o protocolo cumpre um papel relevante na promoção da cultura antirracista no ambiente privado, especialmente em espaços com grande fluxo de pessoas, como shoppings, bares, restaurantes, hotéis e empresas.
“Precisamos fomentar ambientes seguros e acolhedores para todas as pessoas. Este protocolo estimula uma mudança cultural que é fundamental para combater o racismo estrutural”, afirmou.
Racismo já é crime no Brasil
O Brasil tem uma das legislações mais rígidas do mundo contra crimes de racismo. A Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, define os crimes resultantes de preconceito de raça e cor. Em 2023, o Congresso endureceu ainda mais as regras, com a aprovação da Lei nº 14.532/2023, que passou a considerar a injúria racial como crime de racismo, tornando-o também inafiançável e imprescritível.